quinta-feira, setembro 01, 2011

Arnaldo Jabor

[Foto: JMG]

O amor é uma construção do desejo. O sexo não depende do nosso desejo; o nosso desejo é que é tomado por ele. Ninguém se masturba por amor. Ninguém sofre com tesão. Amor e sexo são como a palavra farmakon em grego: remédio ou veneno - depende da quantidade ingerida. O sexo vem antes. O amor vem depois. No amor, perdemos a cabeça, deliberadamente. No sexo, a cabeça perde-nos. O amor precisa do pensamento. No sexo, o pensamento atrapalha. O amor sonha com uma grande redenção. O sexo sonha com proibições; não há fantasias permitidas. Amor é o desejo de atingir a plenitude. Sexo é a vontade de se satisfazer com a finitude. O amor vive da impossibilidade - nunca é totalmente satisfatório. O sexo pode ser, dependendo da posição adoptada. O amor pode atrapalhar o sexo. Já o contrário não acontece. Existe amor com sexo, claro, mas nunca gozam juntos. O amor é mais narcisista, mesmo entrega, 'doação'. O sexo é mais democrático, mesmo vivendo do egoísmo. O amor é um texto. O sexo é um desporto. O amor não exige a presença do outro. O sexo, mesmo solitário, precisa de uma 'mãozinha'. Certos amores nem precisam de parceiro; florescem até na maior solidão e na saudade. Sexo, não - é mais realista. Nesse sentido, o amor é uma busca de ilusão. O sexo é uma bruta vontade de verdade.

O amor vem de dentro, o sexo vem de fora. O amor vem de nós. O sexo vem dos outros. 'O sexo é uma selva de epilépticos' (N. Rodrigues). O amor inventou a alma, a moral. O sexo inventou a moral também, mas do lado de fora da sua jaula, onde ele ruge. O amor tem algo de ridículo, de patético, principalmente nas grandes paixões. O sexo é mais quieto, como um cowboy - quando acaba a valentia, ele vem e come. Eles dizem: 'Faça amor, não faça a guerra'. O sexo quer guerra. O ódio mata o amor, mas o ódio pode acender o sexo. O amor é egoísta; o sexo é altruísta. O amor quer superar a morte. No sexo, a morte está ali, nas bocas. O amor fala muito. O sexo grita, geme, ruge, mas não se explica. O sexo sempre existiu - das cavernas do paraíso até as 'saunas relax for men'. Por outro lado, o amor foi inventado pelos poetas provençais do século XII e, depois, relançado pelo cinema americano da moral cristã.

Amor é literatura. Sexo é cinema. Amor é prosa; sexo é poesia. Amor é mulher; sexo é homem - o casamento perfeito é do travesti consigo mesmo. O amor domado protege a produção; sexo selvagem é uma ameaça ao bom funcionamento do mercado. Por isso, a única maneira de controlá-lo é programá-lo, como faz a indústria da sacanagem. O mercado programa as nossas fantasias. Não há 'saunas relax' para o amor, onde o sujeito entra e apaixona-se. No entanto, em todo bordel, finge-se um 'amorzinho' para iniciar. O amor virou um estímulo para o sexo. O problema do amor é que dura muito, já o sexo dura pouco. O amor busca uma certa 'grandeza'. O sexo é mais em baixo. O perigo do sexo é que podemos apaixonar-nos. O perigo do amor é poder transformar-se em amizade. Com camisinha, há 'sexo seguro', mas não há camisinha para o amor. O amor sonha com a pureza. O sexo precisa do pecado.

Amor é a lei. Sexo é a transgressão. Amor é o sonho dos solteiros. Sexo, o sonho dos casados. O amor precisa do medo, do desassossego. O sexo precisa da novidade, da surpresa. O grande amor só se sente na perda. O grande sexo sente-se na tomada de poder. Amor é de direita. Sexo, de esquerda - ou não, dependendo do momento político. Actualmente, sexo é de direita. Nos anos 60, era o contrário. O sexo era revolucionário e o amor era careta.

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