sábado, julho 02, 2011

Nightmare


Tinha um sonho frequente, recorrente, sempre o mesmo há meses, embora só recentemente tivesse ganho consciência dele - e de que se repete. Está sentada num banco da estação de comboios. Feliz, parece. Há milhares de pessoas de todos os feitios em todas as direcções, mas ela consegue ver nitidamente cada uma delas como se todas caminhassem ordenadamente e em fila indiana para que as pudesse ver melhor. Não se distrai com nada, não lê um livro, não pega no jornal, não desvia o olhar da linha sequer para fumar. E como nos filmes, as horas vão passando, uma, duas, três. Oito, nove, dez. E como nos filmes, o sol vai descendo até ao crepúsculo. Está à espera de alguém que não chega. Só há três planos, todos fechados: o dela no banco, o do relógio pendurado acima da cabeça e o da porta do comboio quando abre. E já só há sombras, noite cerrada, a estação quase vazia, ninguém, só ela ali alvoroçada desde a alvorada. Desiste. Apanha o comboio, instala-se na janela de uma carruagem vazia. O comboio cruza-se com outro comboio. Lá dentro segue por quem ela esperou o dia inteiro. Os olhares de ambos cruzam-se. Ela vê-o, reconhece-o; ele não. Não é louco nem chegou atrasado, simplesmente não ia ao encontro dela, nem sequer sabe quem é. Trocava o sonho pelo bilhete.

1 comentário:

  1. Uma questão de pagar o preço...cinematográfico, dramático,e em complemento com Pavese, poético na sua infinidade de sombras ...

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